VER, REFLETIR, COMPREENDER, AGIR
Bruno Müller

O ser humano tem uma enorme dificuldade de agir em conformidade com sua consciência. É possível que essa sua própria fragilidade moral explique porque, em determinado momento, os governos se tornaram necessários. É preciso não apenas alguém para fazer as coisas por nós: é preciso também alguém para culpar quando as coisas dão errado, e alguém para assumir a responsabilidade de fazer o que deveria ser dever de todos.

À medida que a sociedade se complexifica fica realmente mais difícil assumir o controle de muitos aspectos da nossa vida e, assim, torna-se compreensível - mas também cômodo - afirmar que não fazemos algo a respeito porque simplesmente não podemos.

Mas existem aspectos da nossa vida que podemos controlar. A maioria deles diz respeito à forma como lidamos com nossos semelhantes. E é aqui que a fragilidade moral da humanidade se revela. Quando observamos as relações sociais percebemos que não é apenas no outro, nas figuras distantes, nas abstrações e nas figuras de poder que reside o problema. O problema está em cada um de nós.

Nossa parcela de responsabilidade nem sempre está óbvia para nós, entretanto. Às vezes a realidade nos escapa devido à alienação que o cotidiano nos impõe. Trabalho, estudos, ir e vir, comer. Perdemos tanto tempo SOBREVIVENDO que acabamos esquecendo de VIVER. Já dizia Oscar Wilde: "Viver é o que há de mais raro neste mundo. Muitos existem, e é só". Mas é quando se percebe a realidade que toda a nossa forma de agir muda - ou deveria mudar.

Pois muitos continuam tentando se iludir com fórmulas para escapar ao nosso quinhão de responsabilidade: "não fui eu que fiz o mundo assim, nem serei eu quem vai mudá-lo".

Será que essas pessoas realmente crêem nisso, ou usam como escudo para a própria fragilidade moral? Será difícil de perceber que cada consciência despertada é uma pequena mudança no mundo?

A pessoa que desperta para a realidade, muitas vezes chocante, passa a ter uma responsabilidade duplicada - na medida do seu despertar. É uma responsabilidade que muitos de nós não conseguem assumir, lidar ou suportar, até porque fomos adestrados para pensar pouco, fazer como nos dizemos, nunca questionar a autoridade e o senso comum.

E é aqui que o veganismo se torna uma filosofia paradigmática. Ao pegar os hábitos mais cotidianos - e justamente por isso mais próximos da nossa realidade e, por outro lado, justamente por isso mais mecânicos e, portanto, distantes da nossa consciência, o veganismo nos desperta para o nosso PODER de transformar a realidade de acordo com a nossa consciência.

E para qualquer pessoa que tenha tido contato com o que hoje sabemos sobre a sensibilidade dos animais, e sobre como cada espécie de animal é única, cada qual com suas habilidades específicas, as quais estão tão distantes de nós quanto contruir satélites está distante deles, fica patente que cada um de nós é igual na diferença. E que o poder do ser humano de transformar a natureza não lhe dá o direito de subjugar seres que compartilham tanto conosco em termos de sensibilidade.

E é essa a proposta do veganismo: que ajamos em conformidade com nossa capacidade de compreensão e façamos nossa parte para acabar com algumas das maiores atrocidades que o ser humano é capaz de promover: aquelas feitas contra os animais escravizados, torturados, mortos para satisfazer nosso prazer, nossos interesses, nossa curiosidade. Basta uma ação individual, ninguém precisa esperar a aprovação de uma lei, pegar um rifle, depositar um voto ou torcer pela clarividência da próxima geração. Você pode fazer algo HOJE: diga não à violência, à exploração, à afirmação do poder pelo poder, à presunção de superioridade tão irracional para uma espécie que se qualifica como dotada de razão. Diga não. Não consuma mais o sofrimento e a escravidão sob a forma de comida, roupa, shampoo, remédio. Boicote os produtos de origem animal. Seja VEGANO.


Bruno Müller é é historiador e ativista pelos direitos animais. E-mail: bfmuller@gmail.com